Cearense decidiu fazer parte de movimentos políticos depois de participar dos protestos em 2013: ‘Manter o foco na luta’

Madea Bandor
Madea Bandor

Lara Costa, hoje com 29 anos, já se incomodava com as desigualdades sociais e questionava seu lugar como mulher desde o fim da adolescência, mas foi a partir dos protestos de 2013 que tomou uma nova decisão: iria se comprometer com mais afinco no movimento estudantil.

As jornadas foram uma série de protestos que chegaram ao auge no Brasil em junho de 2013. Inicialmente, o movimento começou com manifestações de rua contra o reajuste da tarifa do ônibus, e se intensificou em São Paulo, onde, à época, a passagem aumentaria 20 centavos.

Rapidamente os protestos se espalharam por outras cidades do país, dando vazão a uma ampla insatisfação popular com outras demandas, como a revolta pela realização da Copa do Mundo em 2014, as denúncias de corrupção na política e o governo de Dilma Rousseff (PT).

Manifestantes em Fortaleza tentam romper bloqueio da polícia — Foto: Vanderlei Almeida/AFP
Manifestantes em Fortaleza tentam romper bloqueio da polícia — Foto: Vanderlei Almeida/AFP

Depois dos atos de junho de 2013, que expuseram um descontentamento generalizado com a classe política, vieram a Operação Lava Jato, o impeachment de Dilma, a popularização de Bolsonaro e o fortalecimento da extrema-direita no país.

Na época, Lara cursava Secretariado Executivo na Universidade Federal do Ceará (UFC), mas não demorou a perceber que seu caminho era outro, o Direito. “Tinha demandas mais pessoais, minha vida era muito comum. Já tinha muita vontade de estudar na universidade pública. Sempre questionei muito as desigualdades como um todo, em um sentido do que eu poderia ou não fazer”, relatou ao g1.

Lara Costa decidiu permanecer em movimentos políticos ao participar dos protestos de junho de 2013, em Fortaleza. — Foto: Arquivo pessoal.

O primeiro contato com os movimentos sociais veio ainda na primeira graduação, principalmente a partir do Centro Acadêmico. Ela trata esse momento como bastante definidor, já que foi onde enxergou seus privilégios. “Eu podia pegar o carro da minha mãe para ir para faculdade à noite e tinha um carro na minha casa. Tinha o privilégio de no primeiro ano da faculdade não precisar trabalhar”, exemplificou.

Até trocar de curso, Lara ainda participou de algumas atividades do movimento estudantil do Secretariado Executivo, mas foi em 2013, quando participou de dois congressos da União Nacional dos Estudantes (UNE), que ela resolveu se organizar.

“Foi meu primeiro movimento, chamado Rompendo Amarras. A gente se reunia aos sábados e pautava muito a questão do movimento estudantil”, explicou.

O primeiro encontro da UNE aconteceu no início de 2013 e o segundo, próximo ao ápice dos protestos naquele ano, ocorreu em maio. “Lembro que nesse teve umas manifestações tanto pela passagem (o preço estudantil), como marchas antiproibicionistas, piso salarial da Educação e sobre o pré-sal”. O segundo congresso foi uma prévia do que estava por vir.

Na volta a Fortaleza, a estudante continuou engajada nas manifestações, que foram as suas primeiras experiências em protestos de maior impacto. Como Lara relembra, os atos contra a Copa das Confederações ganharam um peso a mais na capital:

“A gente teve muitos conflitos aqui em Fortaleza porque as comunidades estavam sendo removidas. Foi um momento em que as contradições aumentaram, no sentido de ficarem mais visíveis. Como estava sendo tudo reformado, tanto investimento para um evento internacional, sem garantir o direito básico para a população?”, relembrou.

Na época, uma série de manifestações estavam sendo realizadas nas cidades-sede da Copa das Confederações. Como o g1 Ceará documentou, os manifestantes se reuniam em diversos pontos da cidade, como a Praça Portugal, Gentilândia e Praça do Ferreira. Os atos duravam dias seguidos e eram organizados através das redes sociais.

No dia 20 de junho, por exemplo, pelo menos 14 mil pessoas confirmaram presença na Praça Portugal, no Bairro Aldeota. Além dos cartazes pedindo transporte de qualidade e a entrega das carteiras estudantis, os participantes também protestaram contra a PEC 37 e contra o projeto da “Cura Gay”, noticiou o g1 na época.

A Proposta de Emenda Constitucional 37/2011 pretendia emendar a Constituição brasileira para incluir a apuração de investigações criminais como atividade privativa da polícia judiciária;

Já o Projeto da “Cura Gay” falava sobre formas de “extinguir” a homossexualidade de uma pessoa. O projeto foi arquivado.

“Na época, as manifestações eram muito difusas. Nós que já estávamos organizados em coletivos tínhamos algumas cautelas. Tinha muito medo de infiltração policial, de criminalização. Tinha gente que ia para o enfrentamento mesmo. Lembro que falaram muito de Black Blocs. Eu tinha uma postura mais preventiva: já ia levando uma máscara (antigás)”, descreveu Lara.

Os black blocs foram uma tática bastante utilizada por alguns manifestantes na época, como uma forma de se organizar em um protesto, preferindo o confronto direto.

O tema dividiu opiniões nos protestos de junho, já que os protestantes usavam pedras, coquetéis molotov e outras ferramentas para mostrar sua indignação.

Um dos legados que a estudante levou de 2013 para o ano seguinte foi ajudar a fundar o coletivo Rua, que surgiu a partir da junção entre o Rompendo Amarras e o Levante Laranja. Nesse período, ela já havia se dedicado totalmente ao Direito, onde se formou e hoje atua, inclusive, na área de Direito Fundiário e assessoria jurídica para populações vulneráveis.

“A ideia era criar um coletivo nacional, um movimento de juventude. Com esse movimento, a gente mobilizou muita gente na UFC. Basicamente, Ceará e Rio de Janeiro sempre foram bem atuantes no Rua”.

Apesar de considerar as manifestações difusas, dispersas, e que o movimento foi cooptado pela direita depois, Lara reconhece que os legados existem e podem ser celebrados.

“Era mais uma questão de tensionar os governos mais à esquerda. Não era uma decepção com o Partido dos Trabalhadores (PT), não sou dessa época. Mas, era um sentimento de que não estavam atendendo às demandas. Era uma geração que não estava satisfeita”, refletiu.
Até hoje, quando olha para trás, o sentimento maior é de orgulho, especialmente pela sua participação no movimento de mulheres e estudantes.

“Tem umas leituras muito pessimistas de 2013, mas acredito que o maior legado é manter o foco na luta. Realmente só a mobilização popular consegue pressionar e fazer com que as coisas mudem. Não tem como mudar a ordem só respeitando ela. O movimento pode ser pacífico, mas tem que gerar impacto”, encerrou.

Share This Article
Leave a comment

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *